Olhei para mim mesmo e vi abismo Vi glória ao virar da esquina Vi qualquer coisa que me escapa Porque o sou e não penso que o sou Vi-me a mim e vi-me triste Porque sou triste se não sou ao mesmo tempo que me vejo Porque não sou o que sou para os outros O que sou é bom de ser para os outros E tenho pena de não me ter para mim Quando me vejo a mim a olhar para mim triste E ter alguém que não eu A dizer que gosta muito de mim E nesse momento ser pleno Porque te tenho a ti.
Esplanada de Campo de Ourique gerida por duas francesas. Estou eu em meditações sobre nunca ter pedido nenhuma Lisboa assim. Mal saí de Portugal. Sabia onde queria estar. Gostava desta cidade. Gostava quando não era polida. Quando não sabia receber. Quando era portuguesa. Nisto chega uma dondoca de meia-idade de Campo de Ourique ao café. Pede um gelado. Para a mãe. Tem um cão com ela. Chama-se Prego. Tudo isto sei pela interacção que tem com um rapaz que também tem um cão. Cachorro. Vai ficar cá. Porque é francês e porque o cão é cachorro. A senhora diz que o cão é mau mas que com este se dá bem. Diz que estranhamente. À minha frente tenho um senhor inglês curioso que pede a ementa toda. Sei que está de passagem, porque também comprou uma camisa que só compram as pessoas de passagem e porque pede a ementa toda. Sei que é curioso porque lhe despertei a curiosidade. Ele também me desperta a mim. Ele é um típico english man velho. Tem um chapéu que um inglês usaria em ...
Quando o meu pai estudava comigo Eu tinha boas notas E quando o meu pai estudava comigo A televisão estava ligada. Quando o meu pai estudava comigo Eu tinha boas notas Porque a televisão estava ligada E o meu pai não se importava. Era frequente quando o meu pai estudava comigo Distrair-me para ficar fascinado com as imagens da televisão O meu pai pedia atenção e eu voltava ao estudo E por isso tinha boas notas. Lembro-me como se fosse ontem Da candura do meu pai Quando estudava comigo Para que eu tivesse boas notas. Agora falamos ao telefone Sobre a actualidade E o meu pai candidamente Estuda comigo a realidade. E quando está mais doente E não pode falar ao telefone Pergunto-me se ontem terá sido a última vez Em que tenhamos estudado alguma coisa juntos.
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