O Inglês Quer Estar

 Esplanada de Campo de Ourique gerida por duas francesas. Estou eu em meditações sobre nunca ter pedido nenhuma Lisboa assim. Mal saí de Portugal. Sabia onde queria estar. Gostava desta cidade. Gostava quando não era polida. Quando não sabia receber. Quando era portuguesa.

Nisto chega uma dondoca de meia-idade de Campo de Ourique ao café. Pede um gelado. Para a mãe. Tem um cão com ela. Chama-se Prego. Tudo isto sei pela interacção que tem com um rapaz que também tem um cão. Cachorro. Vai ficar cá. Porque é francês e porque o cão é cachorro.
 
A senhora diz que o cão é mau mas que com este se dá bem. Diz que estranhamente.

À minha frente tenho um senhor inglês curioso que pede a ementa toda.  Sei que está de passagem, porque também comprou uma camisa que só compram as pessoas de passagem e porque pede a ementa toda. Sei que é curioso porque lhe despertei a curiosidade. Ele também me desperta a mim. Ele é um típico english man velho. Tem um chapéu que um inglês usaria em Espanha, no calor. Imaginaram de palha? 

Os eléctricos hoje não vêm cheios de turistas. Um condutor de eléctrico que vem beber um café aparece e ele é a personificação da alegria. Está alheio aos meus pensamentos, como deve estar. Está até alheio a que reparem nele. Não percebe minimamente. É alegre. Não o é porque sabe que o é.

O inglês tem um sorriso contínuo. Não por bonomia. Acho que por excesso de wisdom. Talvez por excesso de humor inglês. Acho que se encontram as duas coisas nele em simultâneo. Já não tenho curiosidade sobre ele. Isto é, sobre falar-lhe. Quero escrever sobre ele. Sei também que a cultura dele é a mais permanente. Por isso tem esse sorriso enorme. Que não se esgota em invadir países. Em manipular. Em dividir para conquistar. Não se esgota. O sorriso não é sardónico. Convida a falar. Quer estar. Sacanas dos ingleses que querem estar em todo o lado. E estão. E falam connosco e acabam a mandar em nós. Sem querer. Só porque são os sacanas mais manipulativos do mundo, sem o querer, sem ter nada em vista. Só porque gosta de falar. Só porque toda a gente quer falar com um inglês. E agora todos falamos inglês.

Volto atrás. Eu não pedi esta Lisboa. Também terão o seu castigo, os ingleses. Porque algum dia acontecerá que eles quererão ir a algum sítio, curiosos, e não tenham uma casa à qual voltar. Porque eles voltam sempre. Espero que não possam voltar qualquer dia para contar. Espero que os filhos deles, um dia, não saibam ser ingleses.

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