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Sobre psicoterapia

Sabe um elefante que é magnânimo? Sabe um leão que é feroz? Sabe uma formiga que é trabalhadora? Sabem sê-lo e por isso são-no ou são-no-lo simplesmente? Posso eu ser mais do que eu próprio? Posso saber eu quem sou e mudar quem sou mediante a minha vontade? Posso eu ter noção de quem eu sou porque me posso ver no reflexo de um lago? Ou no reflexo dos olhos do outro?  Estas são as questões de quem embarca por uma terapia. E a resposta que pretendemos dar a todas estas questões é sempre a mesma: Sim. Saber o que somos ajuda-nos a não limitarmo-nos ao que repetimos involuntariamente. Ajuda-nos a não ser involuntários. Não sendo involuntário, é consciente. Sendo consciente, é alterável.  

M

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Olhei para mim mesmo e vi abismo Vi glória ao virar da esquina Vi qualquer coisa que me escapa Porque o sou e não penso que o sou Vi-me a mim e vi-me triste Porque sou triste se não Sou ao mesmo tempo que me vejo Porque não sou o que sou para os outros E o que sou é bom de ser para os outros E tenho pena de não me ter para mim Quando me vejo a mim a olhar para mim triste E ter alguém que não eu  A dizer que gosta muito de mim E nesse momento ser pleno Porque te tenho a ti.

Miradouro da Peninha

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Miradouro da Peninha e o céu confundia-se com a terra O mar era céu e o céu era mar. Era tudo cheio, tudo pleno, tudo em completude. Miradouro da Peninha, o céu confundia-se com a terra e eu cheio de pena Porque não te tinha a ti

Maria Reis

 Gosto muito da Maria Reis. Afinidade estética, emocional, musical. Houve um dia em que um amigo meu disse que me estava a comportar como um fã desmesurado a conhecer uma "estrela" quando houve a oportunidade de a ver e conhecer. Oh, mas as Pega Monstro são grandes. E começa logo pelo nome. Aquele objecto meu de infância que acabava na cara dos amigos e nos tectos das aulas. Como memória de infância é uma memória de alegria. De saudade. De paz. E saltamos para a música. No que fazem, que é música, que é palavra, são grandes. Mostraram-me o poema "O moinho de café/ Mói grãos e faz deles pó/ O pó que a minha alma é/ Moeu quem me deixou só" de Fernando Pessoa tão bem musicado.  Mais do que tudo isto, sei que gosto dela sem que ela goste de mim. E nisto comporto-me como qualquer fã. Ah, mas eu acho que gosto dela de maneira diferente. Gosto porque no momento em que ela é grande, só eu me apercebo de que está a ser grande, e é um momento nosso, embora seja só meu, mas no

Será este texto à moda da Adília Lopes

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 Pensei nesta ideia: É preciso ensaiar ser-se ridículo para se saber ser sério. E pensei na Adília Lopes, como se fosse uma coisa que dissesse, mas depois de reflectido, não parecia. Depois pensei melhor e pensei fosse ela a dizê-lo como diria? E comecei a escrever o seguinte poema: Saí à rua e desci a Avenida de Liberdade a 24 de Abril. Dormi bem nesse dia. Acordei no dia seguinte e comi amoras, porque são boas. Liguei a televisão e estava muita gente a descer a Avenida da Liberdade. Saí imediatamente à rua para comprar mais amoras. Dormi bem nesse dia, segura de que teria amoras no dia seguinte. Depois, acordei e fui ao supermercado e às lojas e aos cafés, para ver se toda a gente tinha comprado e comido amoras, porque são boas. Não reparei numa procura anormal pelas amoras.  Agora que concretizei o poema a pensar na Adília Lopes, penso que a única coisa que queria era escrever um poema à laia da Adília Lopes, e que a ideia inicial que me fez pensar nela, não tinha nada a ver com ela

Marvin Gaye

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Para os tristes com a vida, para os que dançam na penumbra, para os que dançam sozinhos mas nunca com gente, para os que dançam só quando a pista de dança está vazia, para os que dançam por dentro, fervilham e afogam a vontade num copo, para todos que são uma só pessoa, deixo esta música: I used to go out to parties, and stand around 'Cause I was too nervous, to really get down But my body yearned to be free I got up on the floor, somebody could choose me No more standin' there beside the walls Finally got myself together, baby, and I'm havin' a ball Long as you're groovin', there's always a chance Somebody watchin' might wanna make romance Move your body, ooh baby, you dance all night To the groove and feel alright Everybody's groovin' on like a fool But if you see me, spread out and let me in Baby, just party high and low Let me step into your erotic zone Move it up, turn it 'round Ooo, shake it down Oww, you can love me when you want to, b

I Came to Your Party Dressed As A Shadow - Piano Magic

Vim à tua festa vestida de sombra Sem tu nunca saberes, nunca soubeste Deslizei pelos corredores como uma onda de veludo Tão calada quanto um palco vazio Escureci-te os olhos e roubei-te a luz do copo Mas ao raiar da manhã queda e fria Espraiei-me como um papagaio-de-morte na tua relva Vim à tua festa vestida de sombra Sem ser convidada, sem um motivo Arrumei a três ruas da lua A caminhada doce até tua casa num fio prateado Dançavas no jardim ao ritmo de uma lata Furtiva deslizei pelas notas Remetendo-as para a madrugada Isto é sintomático de nós os dois: Tenho cheios frascos do teu hálito Tenho conchas das tuas palavras Mas tu não tens nada meu Senão um espaço onde eu ficaria Tradução de letra da música I Came to Your Party Dressed As A Shadow dos Piano Magic

O Ventura é ditador

A coisa que mais me deu asco que o Ventura disse pode ser uma surpresa para alguns, já que ele prima por aí. A coisa que mais me deu asco foi ele ter descrito a pessoa que recebe este subsídio como a pessoa que o gasta em uísque e tabaco e drogas, como se fosse uma coisa reprovável e sobre a qual se queira ter controlo. E a coisa que mais me deu asco não tem nada a ver com ser a favor ou contra gastar o dinheiro que se recebe em uísque ou tabaco ou drogas, tem a ver com alguém querer limitar a liberdade de alguém gastar o dinheiro que tem em seja o que for o que lhe dá na real veneta. Isto deve enfurecer qualquer pessoa. Penso, como oposição a isto, no filme de João César Monteiro, em que a personagem João de Deus, ao receber uma quantia choruda oferecida por um louco, que, por ser em dinheiro vivo, torna-se a maquia ainda mais pujante, diz, sinceramente e malandro, que a vai gastar mal gasta. Engraçado que nunca até hoje tinha pensado nisto como mais do que uma piada. E no filme é o q

Blade Runner

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    " I've seen things... seen things you little people wouldn't believe. Attack ships on fire off the shoulder of Orion bright as magnesium... I rode on the back decks of a blinker and watched C-beams glitter in the dark near the Tannhäuser Gate. All those moments... they'll be gone... like tears in the rain. Time to die."      Esta é a fala final de um andróide no filme Blade Runner de que eu muito gosto. Como ele é algo de estranho a um humano, não intuímos isto como vindo de uma pessoa. Mas isto é o final de vida de qualquer pessoa que teve glória e que lamenta que o que viveu se vai perder. Não é a vida senão deixar memória de nós no mundo? Alcançar glória para lá de nós? Não temos todos nós perfeita noção de que a vida é transitória e de que temos de fazer obra? Sejam crianças, construir casas, plantar uma árvore ou simplesmente ser lembrado por quem fomos, seja o que for que demore um pouco mais a desaparecer.       E o facto de ele dizer que "vi coisa

Zorba, O Grego

     Passa-se numa ilha, Creta, em que os intervenientes são bem demarcados, o povo comporta-se como povo estanque, comportamentos em uníssono sempre. Só umas poucas personagens são caracterizadas. O terreno é árido. Tudo ali tem pouca vida. E o mar que circunda a ilha asfixia o espectador. Zorba, o grego, podia estar ali como podia estar em qualquer sítio, porque vai aonde a vida o leva. O inglês que lá vai, vai porque não importa onde está, nunca vive lugar nenhum. O inglês não vive. Vive na redoma em que os livros o cobrem. Zorba tira-lhe os olhos dos livros. E tentam um feito em conjunto.      Com este filme, não é suposto passar-se um bom bocado. Como digo, tudo é árido. Não há nada verde. Nem as árvores são verdes. Tudo está sempre quente. O que o filme quer dizer talvez seja que a vida é árida e que enquanto vamos em direcção ao fim, que arrisquemos viver, que arrisquemos tentar. Mesmo que falhemos. Tentar de novo. Que não nos resta senão tentar. Uma e outra vez. Que a vida não

OH, FADO! SO NICE

Engraçado isto. Até há pouco tempo, uma tez como a minha era suficiente para afastar um alemão, um inglês, um americano, etc. Um “pástéle de bacálau”, num esforço heróico de ajustamento vocal à língua do estrangeiro, dito a um deles pelo tasqueiro quando lhe perguntava o que era apontando para o pastel, bastava para afastar qualquer tipo de esperança de vir a comunicar por terras lusas. Era insuficiente para afastar outros que se estavam a lixar para isso, que só queriam tentar a sorte, mas esses não vinham, porque não haviam os alemães, os ingleses, os americanos. Neste momento, a minha tez não é suficiente para os afastar, porque não vêm sozinhos. A minha língua pouco importa porque inglês é a língua franca. Vêm apesar de mim. E nisto está o lisboeta, agrilhoado à solta, como num safari. Os animais do safari sabem que estão num safari? Ou chamam-lhe natureza? Mas não é a natureza. É um safari. A história é escrita pelos vencedores. E nós, lisboetas, já não mandamos em nada nesta cida

Um Homem Tranquilo - John Ford

     É muito estranho que este filme tenha sido feito. E é estranho não porque é antigo, não porque é datado, o filme não tem um senão: é tão estranho assim porque nos afastámos tanto de um mundo em que filmes destes existam e sejam feitos e também porque não parece o seguimento da História. Seja do cinema, seja dos costumes, seja do que for que este mundo é e que este representado no filme não tem.      O antónimo de mundo é imundo. E neste filme é tão claro que este do filme é um verdadeiro mundo, impoluto, casto mesmo no vício e na errância.       O filme começa por um homem regredido à infância. E volta a casa. E depois eles vêem-se.      Mary Kate precisa de um homem, um lar, filhos para estar completa. Sean precisa do mesmo e, assim que chega, Sean compra uma casa, e, assim que chega, vê a mulher que irá ser a mulher da sua vida, mãe dos seus filhos. Sean pensa que está tudo feito. Mary Kate sabe bem que não é assim. O que se segue a isto é todo um desenrolar de atribulações que
O dia de hoje é cinzento Como podia não ser? Tem cravado um lamento E uma mãe manda chover Oh, Nohinha... A quem o evoca A lágrima boa Logo convoca  E da vista coa Não há sol  Não há Noah Há só sal Que abençoa

Os pássaros e os velhotes

Há coisas que se mantêm de geração para geração. Ver isso em prática trouxe-me tranquilidade. Cresci a ver velhotes a darem comida a pássaros. Quando era miúdo e assistia a isto, o velho que vi hoje dar comida a pássaros tinha 40 como eu agora.  Ele tem agora 70 e dá também comida a pássaros, como esse velho de 70 que assisti dar comida a pássaros há 30 anos.  Se transpusermos isto para tantos actos, tradições, vontades, traz-me uma grande tranquilidade. Também porque sinto que o mundo está a mudar muito à minha volta. Mas há muita coisa que não muda. Os pássaros todo o dia, nas traseiras de minha casa, esperam pacientemente pelas migalhas do almoço, do lanche, do jantar do velhote. Pássaros pequenos, maiores e maiores ainda, todos esperam pacientemente por estes velhotes. Os vindouros pássaros filhos dos pássaros filhos dos pássaros, nas traseiras da minha casa, algures na minha cidade, esperarão pacientemente por mim, quando tiver 70 anos, para lhes dar migalhinhas do meu lanche. Lá

Retomando o tema do futebol.

Retomando o tema da inveja de muitos: Um triste é triste porque não consegue ser alegre. Um chato é chato porque não consegue interessar. Um imbecil é imbecil porque não sabe ser inteligente. Um pobre é pobre porque não consegue ser rico. Não o contrário. E vocês todos que são bombeiros, agentes imobiliários, actores, escritores, etc. , são-no-lo porque, em primeiríssimo lugar, não tinham jeito para a bola.  Tangas à parte, é isto.

Para as "Pessoas" de um Pessoano

 Vou falar sobre a não-individualidade dos betos e da individualidade que as pessoas que identificam os outros como betos reclamam para si.  Sempre vi chamarem-me de beto como um insulto. E passo a explicar porquê. Nesta merda letárgica, sofredora e cómica de ser Tiago, nunca vi nenhum beto que se me assemelhasse. Mas quando mo chamam, enfiam-me num saco. Até há pouco tempo percebi que o que mais me chateava não era o saco onde me metiam, era o facto da pessoa que o dizia achar de si própria que não tinha saco nenhum em que se meter, que para ela era reservada toda a complexidade de ser simplesmente pessoa.  Mas foda-se se não sou pessoa também, com toda essa complexidade inerente. 

O gordo vai à baliza

Há pouco estive a ler um justiceiro, falar sobre tanto tema da actualidade, tipificando o "tuga" como o estúpido comezinho que só sabe ver e falar de bola, pouco mais para além disso. Farto de justiceiros. Farto dessa ideia colectiva do que é o português, Portugal não é senão uma ideia colectiva da qual faço parte no particular. Partir do colectivo para o particular-colectivo tipificando o português só lhe retira toda a complexidade.  Tou farto da simplificação para chegar a um argumento, para facilitar uma ideia. Temos de ser particulares. Temos de não ter medo de sermos particulares. E sim, sob pena de ninguém nos entender. E sim, sob pena de nos confundirmos.  Se há coisa que um puto português da minha geração fazia, gostando ou não, era jogar à bola. Esquecemo-nos disso? Que a bola é transversal a todos os putos portugueses? Caguei para quem ia à baliza, caguei para quem levava com as boladas, para quem não conseguia marcar golos, para quem era escolhido em último na form

Texto perdido

O meu amor tenta-me controlar.  Parece que tenta, através da não individuação, diluir-se. Não somos nós que nos diluímos, é só ela.  Pelo contrário, afasta-me a mim, faz-me sentir mais a minha vontade. E parece que tem medo da minha vontade.  Que é estar com ela.

Línguas

     Mais do que tudo o que nós possamos saber em quantidade, mais do que o acumular de conhecimento, interessa como o usamos. E isto não é nada fácil de saber, não porque eu ou qualquer outra pessoa - vou-me dar ao luxo de dizer isso, porque acredito que é assim - tenha chegado ao ponto de acumulação de sabedoria em que acha que não precisa de mais, mas porque quem entende isto precisa de se ter libertado dessa avidez. É como aprender uma língua e usar uma língua. Não há nada nas duas coisas que se ligue.

Vertigo (de Alfred Hitchcock)

Revi este filme há uns anos na esplanada da Cinemateca. Uns idiotas riam-se, achavam a música piegas, tudo piegas. Irritou-me solenemente. Não entender a fragilidade da personagem central deste filme é não perceber a nossa própria fragilidade. E não perceber isto é não perceber nada. Um homem apaixona-se. Um homem perde em circunstâncias tenebrosas a amada. O homem tem uma segunda oportunidade. E desta vez ela morre de facto. Quantas vezes numa vida podemos renascer de situações destas? Poucas. Acontece-lhe um milagre. E depois o milagre é-lhe sonegado. É a maior das tragédias. E a música, que aqueles idiotas acharam piegas, é, para aqueles que acompanham a história de facto, apenas as notas do sentimento desbragado, do que tem de invisível, do que roda no coração, do que se irradia quando estamos apaixonados.   

Quadra para acompanhar ramo de flores

São para ti, meu amor Flores do meu jardim Que te levem toda a dor De estares longe de mim

Texto perdido

  O sorriso dela é de criança, do que a criança tem de puro, de bom. A vida tirou-lhe a facilidade em o mostrar. Mas não lhe tirou o sorriso. De criança. Às vezes, pergunta alguma coisa também cheia de ingenuidade. De criança. E apetece-me a mim ser criança também e responder com aquele peito cheio, de quem sabe. Mas como uma criança. Pelo meio tornamo-nos adultos e esquecemo-nos de confiar cegamente. Quero dar-lhe a mão e ser o primeiro namorado dela. O primeiro. E único.

Quadra para ela

     Toma esta flor      Que há-de morrer     Como eu de amor     Se não te tiver 

Elliott Smith - Somebody that I used to know

I had tender feelings that you made hard But it's your heart, not mine, that's scarred So when i go home, i'll be happy to go You're just somebody that i used to know You don't need my help anymore It's all now to you, there ain't no before Now that you're big enough to run your own show You're just somebody that i used to know I watched you deal in a dying day And throw a living past away So you can be sure that you're in control You're just somebody that i used to know I know you don't think you did me wrong And i can't stay this mad for long Keeping a hold on what you just let go You're just somebody that I used to know  

Melhor É Impossível

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Catarina pede um elogio depois de Tiago a ofender brutalmente. Tiago promete um elogio, mas não sem antes pedir dois pregos e duas imperiais.    TIAGO Mal passados? CATARINA Pode ser. TIAGO  (grita) Mal passados CATARINA Tenho tanto medo que vás dizer mais coisas horríveis. TIAGO Não sejas pessimista. Não é o teu estilo. Aqui vai...  Eu tenho esta... quê? Condição... E o meu terapeuta - um psicólogo - que costumo ver... ele diz que na minha situação arriscares para te sentires vivo ajuda. Eu odeio arriscar. Odeio mesmo. É uma coisa perigosa, arriscar. Nota que estou a usar a palavra odiar. E o meu elogio, a ti, Catarina Trindade, é que desde que te conheço que, bem, mal durmo, ando às voltas na cama, não tenho sossego, não como, tudo por tua culpa... CATARINA  (confusa) Não percebo qual é o elogio... TIAGO Tu fazes-me querer estar vivo.   Catarina fica embevecida. EMPREGADO DE MESA Olhós preguinhos, um para a senhora e um para o senhor!                                E duas imperiais f